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27 de jan. de 2008

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Assim, é perceptível que os “inimigos” apontados por Zaratustra são Jesus Cristo e Platão, que representam as matrizes da cultura ocidental: Jerusalém e Atenas, com sua religião, filosofia, arte, ciência e moral, cuja validade é posta em xeque, assim como a recusa de todos os outros deuses antigos, sob todas as suas formas. Para Nietzsche, o conceito de Deus foi cunhado como uma antítese ao conceito de vida, sendo colado a este último tudo que havia de abjeto, nefasto, rastejante. Já o conceito de “além”, referindo-se ao contrário do mundo palpável, foi inventado para contrariar a realidade terrena, desprezando-a em detrimento do que viria depois da existência material. Finalmente, “alma”, “espírito” e “imortalidade” são títulos arbitrários para desprezar o corpo, tornando-o doentio. É contra todos esses enganos, rótulos equivocados e aprisionadores, que Nietzsche gesta e pare seu Zaratustra. Ele não vem do deserto, como Jesus, mas desce da montanha, com sua águia e serpente, do fundo da caverna, em busca do Sol, e vai ao encontro das pessoas fortes, inquebrantáveis, interessadas em sua moral altaneira, aquelas às quais Jesus se dirigia com reprovação. A águia e a serpente, os animais de Zaratustra, são, igualmente, metáforas, dessa vez contrapostas ao cordeiro e ao peixe, os favoritos de Cristo e ícones da mansidão, quietude e simplicidade. O fato de andarem juntas significa que se reconciliaram o Diabo (a serpente do Gênese) e o bom Deus, ou seja, Júpiter e sua águia (Suffrin, 1999, p. 42). Assim, o bem e o mal andam juntos, não são duas coisas distintas, como a moral milenar até então vigente queria fazer crer. Em uma de suas últimas obras, O anticristo, Nietzsche critica o conceito do Deus cristão como sendo este Deus um “Deus dos doentes, Deus como aranha, Deus como espírito”. Para ele, esse é um dos conceitos mais corruptos que já existiram, conferindo a Deus uma condição degradante de “contradição à vida, ao invés de ser uma transfiguração e o eterno sim! Um Deus que é a declaração de inimizade à vida, à natureza, à vontade de viver!”. No mesmo aforismo, Nietzsche acentua a negação do valor deste mundo em detrimento do outro, semeando o niilismo: “Deus, a fórmula para toda difamação ‘desse mundo’, para toda mentira ‘do outro mundo’! O nada endeusado em Deus, santifica a vontade para o vazio!”